quinta-feira, 13 de setembro de 2007

O burro que jogava poker

Cá se, fazem..., Paulo Baldaia, Chefe de Redacção

Num país civilizado, presume-se a inocência até prova em contrário. Nesse país, é preferível deixar um culpado em liberdade do que condenar um inocente. Mas já não há países assim. Em Portugal, por exemplo, expurgar a culpa é atribuí-la a alguém.

No caso "Maddie", sentimos desde cedo que o Mundo nos achava culpados de ter deixado levar a menina inglesa e, por isso, respirámos de alívio quando pudemos colocar os ingleses sob suspeita. Primeiro Murat, depois o casal McCann.

Suspeitos que não são culpados nem inocentes, mas suspeitos para sempre. Suspeitos porque não choram em público, porque contratam advogados para os defender, porque regressaram a casa.

Sem provas inequívocas, há até quem recorra a um psiquiatra para garantir que "o rosto de Kate esconde algo. Como um jogador de poker". É assim que queremos julgar este caso? Sem o baralho todo mais vale jogarmos ao burro, é um jogo fácil e todos os portugueses sabem jogar.

O que é feito da presunção de inocência? Que é feito da nossa memória? Não vimos já demasiados casos de suspeitos que eram totalmente inocentes? E, mesmo que venha a provar-se a culpa dos McCann, que necessidade temos de os estar a julgar antes dos tribunais?

O pior de tudo isto é que estamos a ajudar a criar uma forma de fazer justiça em que a próxima vítima pode ser qualquer um de nós.

Acontece muitas vezes, quem investiga forma uma convicção de culpa e, incapaz de apresentar provas irrefutáveis em tribunal, faz julgamentos na praça pública com a ajuda de jornalistas também eles convencidos da culpa.

Não é uma convicção do comentador, é o testemunho de um jornalista que já viu isto acontecer demasiadas vezes.

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